Como o mito da “Atlântida” se tornou crença
científica na Europa Germânica e fortaleceu o nazismo?
O
capítulo mais negro da História do nazismo e da Segunda Guerra Mundial tem um
lado escondido e parte dele tem a ver com o mito da Atlântida.
A
visão de supremacia alemã criada por Hitler e seus capangas veio de uma mistura
tóxica, onde seus ingredientes eram: histórias falsas, pseudociência, mentiras
étnicas, uma lenda de uma raça superior e a transformação de um amuleto de boa sorte num símbolo de ódio. Tudo isso
regado a outro ingrediente chamado ocultismo.
Com
isso em mãos, os nazistas embarcaram numa jornada insana de refazer o mundo.
Mas,
por que doutrinas esotéricas eram importantes para Hitler? O que o ocultismo
nos permite fazer?
Nos
permite adotar o sobrenatural, a autoridade mais alta, num domínio não mais regulado
pela Igreja.
Os nazistas queriam acertar as contas com o cristianismo, que segundo eles, era uma das maiores pragas que acometeu a História e que havia enfraquecido a Alemanha. Os nazistas queriam substituir o cristianismo pelas crenças pagãs nórdicas.
Os nazistas queriam acertar as contas com o cristianismo, que segundo eles, era uma das maiores pragas que acometeu a História e que havia enfraquecido a Alemanha. Os nazistas queriam substituir o cristianismo pelas crenças pagãs nórdicas.
Tudo
começou um ano antes do nascimento de Hitler, quando uma das doutrinas ocultas foi
descrita para o mundo num lugar improvável por uma pessoa improvável,
tornando-se um presságio do nazismo vindouro. Vejamos essa história:
Morando
em Londres, havia uma aristocrata russa conhecida como Madame Helena Blavastski
(pseudônimo de “Zeneida R-va”) que escreveu um best-seller de nome “A Doutrina Secreta: Síntese da Ciência,
Religião e Filosofia” (1888).
Em mais de 1.000 páginas ela reescreveu a História do Mundo, desde a “criação”
até os dias atuais. Ela usou fontes nada convencionais como astrologia
babilônica, hieróglifos egípcios e uma mistura de elementos ocultistas aprendidos
em suas diversas viagens pelo mundo (principalmente no Oriente).
Blavatski
não inventou nada. Mas ela deu poder a uma suposta civilização perdida. A
vantagem deste tipo de informação é que as pessoas que controlavam e regulavam
essa informação já haviam morrido, então ela – assim como qualquer um –, podia
dar o significado que quisesse ao assunto. E Blavatski deu mesmo. Segundo ela,
gigantes do continente perdido de Atlântida criaram uma raça de super-homens:
os arianos. Assim, os arianos se tornaram um potente mito de uma raça superior. Para Blavatski eles levaram a
semente da civilização para a Grécia e para Roma. Mas também motivaram os povos
germânicos e se tornaram uma fonte de profunda criatividade cultural. Eles tornaram-se
então a raça superior, a expressão máxima da civilização.
A partir disso,
surgia a ideia do arianismo, evoluída de um mito ocultista.
O
livro de Blavatski é misticismo querendo se passar por História, mas vendeu
bem. E um livro contestando o padrão da História chegou na hora certa, pois a
Europa estava vivendo um momento histórico onde a religião estava sendo
desacreditada rapidamente pelos avanços da tecnologia e da ciência,
testemunhando o nascimento de uma série de escolas místicas de ocultismo,
grupos espiritualistas, centros espíritas, pensamento alternativo, etc.,
principalmente na Alemanha. Havia uma fascinação pelo oculto (também nos
E.U.A.).
A
religião e a ciência deixaram de andar juntas a partir dos fatos descobertos
por Darwin. Durante quase dois mil anos, a Bíblia era a verdade definitiva. Aí,
o cientista Darwin contestou a origem da História. Novas provas da Evolução abalaram
a fé das pessoas até o âmago!
Por
isso, quando Hitler nasceu havia uma nova onda de espiritualismo para um
público atrás de respostas novas. O livro de Blavatski era então um banquete.
Blavatski
é importante por conta da forma como escreveu o livro. As tradições ocultistas,
por definição, eram práticas ocultistas da elite, mas ela contou sobre isso ao
mundo todo.
Blavatski
teve a ideia de que todas as coisas – os planetas, o universo, as pessoas –
passavam por um estágio evolutivo de muitas fases. Tal evolução lhe fez surgir
a ideia de que havia sete raças-raízes. A isso, ela acrescentou a ideia dos
arianos como a 5ª, e então, atual raça, representando muita vitalidade, força e
inteligência, como a futura raça da humanidade.
Um
escritor e ocultista austríaco chamado Guido von List, leu Blavatski sobre a
ideia da raça ariana. Ele então germanizou
esta ideia. A raça superior ficou assim especificamente identificada com um
tipo de destino racial alemão.
Blavatski
reescreveu a História. List, a geografia. Ele transplantou a origem dos arianos
da Pérsia para o norte da Europa. Ele chamou de “Reino Nórdico de Thule”, palavra que quer dizer “antigo paraíso nórdico”.
List
imaginou uma raça superior loura de olhos azuis.
Segundo
Blavatski e outros ocultistas, os arianos eram, então, a raça superior, o ideal
nórdico louro de olhos azuis. Os alemães passaram a sentir que representavam
esse ideal. Desse modo eles passaram a achar que tinham um legado espiritual
para dar à humanidade e uma responsabilidade de purifica-la afim de prepara-la
para o próximo passo da Evolução.
Para
validar sua teoria, von List procurou uma ligação entre os míticos arianos e os
alemães contemporâneos. Depois de procurar muito ele acreditou ter encontrado:
um extinto alfabeto germânico chamado “runas”. Num jogo em que, quanto mais
antigo maior a autoridade, as runas permitiram que os alemães entrassem no jogo.
Blavatski
descreveu a raça dos super-homens. Von List fez com que fossem alemães. Mas
faltava algo: o que é um super-homem sem um arqui-inimigo? O inimigo foi fornecido pelo ex-bispo austríaco
Jörg Lanz von Liebenfels, após encontrar em sua abadia uma imagem numa laje
mostrando um nobre pisando numa fera. A partir daí ele ficou convencido de que “raças
superiores” precisavam suprimir e conquistar “raças inferiores”, pois eram
potencialmente demoníacas, e publicou tais ideias em sua revista Óstara. Ele
avisou que a super-raça ariana precisava se proteger das supostas raças
inferiores, como, entre elas, os judeus. Ele descrevia a miscigenação das raças
e defendia algum tipo de programa de purificação racial baseado em ideias
ocultistas. A ideia de von Liebenfels foi de extermínio através de
esterilização e castração. Muitos leitores gostaram do que leram e permitiram
que a revista circulasse nas ruas de Viena. Entre estes leitores estava um
jovem artista sem-teto e com dificuldades: Adolf Hitler. Ele possuía inúmeros
volumes da revista Óstara e passou a se encontrar com o ex-bispo.
O ex-bispo encontrou um ouvinte de mente fértil.
Quando
Hitler deixou Viena em 1913, ele já possuía a
base da sua perspectiva racial definida.
O
tempo correu, e após a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) um grupo de antissemitas formou uma
sociedade exclusiva chamada Thule, em homenagem à lendária pátria ariana inventada. Seus
integrantes debatiam política, ocultismo e os judeus, e se tornou o berço do
Partido Nazista. Um dia, eles ganharam um novo membro que mudaria a História da
Humanidade para sempre: o ambicioso Hitler.
Em 1933 Hitler assume o poder na Alemanha.
O
restante da História horrível que se seguiu, o leitor já conhece...
Vito Marino
Para saber mais e fontes:
-Documentário
“Hitler e o Oculto”, 2007: http://globosatplay.globo.com/globosat/v/3152508/
-Documentário “Hitler and the Occult”, 2007: https://www.youtube.com/watch?v=qHxeOT8A6sQ
-Artigo “Atlântida. Princípio e Fim”, 2011: http://vitomarino.blogspot.com.br/2011/05/atlantida-principio-e-fim.html
-Livro: “The
Occult Roots of Nazism”, Nicholas Goodrick-Clarke
*Imagens puramente ilustrativas, de domínio público.
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