ORIGEM E SIGNIFICADO DO “OLHO QUE TUDO VÊ”, DO CULTO DA SERPENTE E DA “COBRA MORDENDO A PRÓPRIA CAUDA”.
A história e a mitologia egípcia, sempre fascinaram as pessoas de todo o mundo. E com certeza, ainda continuarão fascinando. E não é para menos, dada a sua riqueza cultural.
A mitologia egípcia engloba muitos Deuses, muitos conceitos e muitos símbolos a se perderem de vista.
Falaremos aqui, de um símbolo egípcio conhecido como o “Olho de Hórus”, também chamado de “Udyat”, e que também é conhecido como “O Olho da Providência”, “O Olho que Tudo Vê”, “O Olho Onipresente”, “O Olho Vigilante” e “O Olho de Deus”.
Ele é um símbolo antiquíssimo e é proveniente do Egito Antigo, e significa “proteção e poder” relacionado ao Deus Hórus. O Olho de Hórus era um dos mais poderosos e mais usados amuletos no Egito, em todas as épocas passadas!
Para os antigos egípcios, o Olho de Hórus era a emanação do próprio Deus. Sua importância alcançada, é facilmente observável no Livro dos Mortos do Antigo Egito*, devido às dezenas de citações ali contidas e transcritas abaixo. O Leitor observará a grandeza atribuída a Hórus em tais citações. Estas citações fizeram com que toda uma crença no “Olho divino” se formasse. Para que o Leitor visualize tal acontecimento, vejamos algumas citações:
“Quanto a ti, oh! demônio Has-as! Eis que Hórus corta tuas garras. Em verdade, foste destruído em Pe e em Dep com tuas legiões de demônios em ordem de batalha. Foi o Olho de Hórus que te venceu!”
(Cap. XL)
“O Olho de Hórus me confere a Vida Eterna. E quando se fecha me protege.”
(Cap. XLII)
“O Olho divino de Hórus me santificou.”
(Cap. XLIV)
“Em verdade, Hórus é o Amo e Senhor do Egito. Ele fixa o curso das coisas para milhões de anos. Dia e noite os Deuses trabalham para ele. Seu Olho divino é fonte de Vida para milhões de seres. Ele é Único, ele, Dono dos Mundos.”
(Cap. LXXVII)
“Em verdade, eu sou Hórus entre os Espíritos santificados, Dono do seu Diadema, Dono de sua Luz. Eis que Hórus, em seu Palácio, está sentado em seu Trono.”
(Cap. LXXVIII)
“Oh! Olho de Hórus! Liberta minha Alma!”
(Cap. XCII)
“Vós viveis da Verdade, e a Justiça é o vosso alimento; vós permaneceis sob o olhar fixo de Hórus.”
(Cap. CXXV)
“Eis que o Olho cintilante de Hórus, Luminoso como Ra, surge no Horizonte. Seus movimentos são cheios de harmonia e destroem o triplo domínio de Seth. Pois havia sido decretado que Seth seria agarrado e levado, e que as chamas devoradoras do Olho divino seriam dirigidas contra ele. Que venha pois essa Chama regeneradora e que eu a possa adorar!”
(Cap. CXXXVII)
“Em verdade, o Olho divino de Hórus vive! Vive! Vive no Santuário do Grande Templo.”
(Cap. CXXXVII)
“Salve, oh! Osíris. Príncipe do Amenti, grande divindade, Senhor de Abydos, Rei da Eternidade, Príncipe da Duração, Deus misterioso do Re-staú! Eis-me aqui! Sê glorificado, Senhor dos Deuses, o Único, tu vivendo pela Verdade da Palavra! Eis que chego diante de ti. Eu, teu filho Hórus, que venho aqui para vingar-te! Às paragens onde reinas cercado das Hierarquias divinas trago a Deusa da Verdade e da Justiça. Rechacei teus inimigos; possa eu permanecer junto a ti! Pois apoiei e sustentei todos aqueles que na Terra participam do teu Ser. Oh! Osíris! Eu sou teu filho Hórus, venho aqui para vingar-te, oh meu Pai, Osíris! E para varrer teus inimigos e para destruir o Mal que se apega à tua pessoa! E para abater quantos te atacam! E para ferir os demônios que te assaltam! Mantenho acorrentados os demônios de Seth! Combati os que te eram hostis!” (Cap. CLXXIII)
O Egito foi, realmente, uma das civilizações mais fantásticas e estudadas de todos os tempos. Sua influência e fascínio chamaram (e ainda chamam) a atenção de todo o mundo. Sua cultura rica, ainda perdurará tal qual sua história, influenciando épocas e pessoas.
Segundo a mitologia egípcia, o olho esquerdo de Hórus simbolizava a Lua e o direito, o Sol. Durante uma luta entre o Deus Hórus e o Deus Seth, o Deus Seth arrancou o olho esquerdo de Hórus, o qual foi substituído por este amuleto no lugar. Depois da sua recuperação, Horus pôde organizar novos combates que o levaram à vitória decisiva sobre Seth.
Os egípcios começaram a confeccionar peças diversas como amuleto, e a escrever hieróglifos, com o desenho do Olho de Hórus, para assim lembrarem de seu Deus e da luta que ele teve de enfrentar. Através deste símbolo, o ser humano quis manter uma proximidade com seu maior Deus. Acreditava-se que havia uma união do Deus Hórus com a Humanidade, pois Hórus zelava pela Humanidade. E assim, Hórus se tornou onipresente, vivo, observador de tudo.
Este símbolo acabou sendo usado para afugentar o mau-olhado, e após a morte do ser humano, era usado contra o infortúnio no Além. Por isso estava presente nas tumbas e nas múmias. Assim, o Olho de Hórus virou um “símbolo de indestrutibilidade”.
Para a elite egípcia, o Olho de Hórus (indestrutibilidade) e também a serpente, passaram a simbolizar poder real, tanto, que os faraós passaram a maquiar seus olhos como o Olho de Hórus e a usarem uma serpente esculpida na coroa faraônica. Também se acreditava que este símbolo de indestrutibilidade poderia auxiliar no renascimento, em virtude das crenças egípcias sobre a alma. Sobre a serpente, acreditava-se que ela deveria atacar qualquer inimigo que se aproximasse do faraó, protegendo-o. Nessa época a serpente não era vista como um símbolo do mal, mas como um símbolo de sabedoria e imortalidade, e assim ficou por muito tempo**. Adiante volto a falar sobre a serpente símbolo...
Sempre se pode observar o Olho de Hórus em hieróglifos egípcios de diversos lugares, como em templos, casas, colunas, tumbas, e objetos como selos, papiros, sarcófagos, objetos ritualísticos, objetos de uso doméstico e decorativos. Até hoje, pode-se comprar este amuleto em forma de bijuterias ou jóia fina, ou ainda como objetos dos mais variados tipos e formatos, em mercados e lojas diversas.
O fascínio pelo Olho de Hórus não para por aí. Os egípcios “retalharam” o Olho do Deus, fazendo com que cada parte separada dele, representasse uma fração matemática: 1/4, 1/8, 1/16, 1/32, 1/64. Cada figura do retalho, separadamente, tornou-se assim um componente da escrita nos hieróglifos egípcios. O simbolismo do Olho de Hórus emigrou para fora do Egito, até a civilização europeia, para grupos místicos e esotéricos, dada a sua significação e utilização egípcia mística. Transformou-se no “Olho do Deus da cristandade”, “O Olho de Javé”. Costuma ser interpretado como “a representação de Deus observando a Humanidade”.
Com o tempo, o Olho de Hórus foi sofrendo sutis variações visuais na forma. Por exemplo, às vezes aparece cercado por raios de luz ou ainda dentro de um triângulo. A adição posterior de um triângulo é uma referência mística explícita à “Trindade de Deus”, no cristianismo.
Podemos encontrar este Olho de Deus dentro de um triângulo, já numa pintura em tela do ano de 1.500 da Era Comum, chamada “A Ceia em Emáus”, do artista Jácopo Carucci da Pontormo (um discípulo de Leonardo da Vinci) que retrata Jesus ressuscitado, com seus seguidores em torno de uma mesa posta. O Olho dentro do triângulo aparece acima e atrás da cabeça de Jesus.
No século XVII o Olho de Deus começou a aparecer desenhado rodeado por nuvens.
O Olho de Deus é também um símbolo frequentemente usado na Maçonaria, e relacionado a ela. Nela, é “o Olho do Grande Arquiteto”, que é o Deus cristão Javé que paira acima de tudo e supervisiona tudo. É então um lembrete para os Maçons de que sempre são observados pelo Grande Arquiteto.
Hoje em dia, já existem
dezenas de livros no mercado, que falam dos ideais da Maçonaria, sua história e seus símbolos. Kirk MacNulty, por exemplo, reuniu em um livro muito rico em detalhes, toda a trajetória histórica maçônica, com muitas fotos e gravuras. Nas suas paginas o leitor interessado pode ver diversas fotos e gravuras do Olho Que tudo Vê de diversas maneiras (inclusive dentro de um triângulo). Outro símbolo maçônico é o “ouróboro”, que é uma serpente mordendo a própria cauda. Como tal, representa a eternidade, o amor e a sabedoria.
“O simbolismo serpentino dos ofitas retrocede até as culturas grega, egípcia e frígia, abrangendo ideias como o domínio sobre a morte, a imortalidade e a sabedoria, e desemboca em um grupo de antigos cultos da serpente, como os ofitas-cainitas, ofitas-sethianos e ofitas-nachaítas. Desses grupos se desenvolveu a tradição gnóstica do ouróboros, o símbolo universal do ciclo de nascimento-morte-renascimento e imortalidade.***” De um modo geral, os símbolos místicos da Maçonaria exprimem o interesse pela metafísica. A origem dos símbolos e dos aspectos decorativos usados por ela são uma derivação da Antiguidade.
No início de sua existência, os maçons sofreram inúmeras perseguições por parte da Igreja e dos governos. Mas é fato que personagens ilustres fizeram, e fazem ainda, parte desta Entidade filantrópica mundial. O Olho que Tudo Vê aparece ainda no reverso do Grande Selo dos Estados Unidos da América (selo este, que é utilizado para autenticar vários tipos de documentos governamentais emitidos, como passaportes, tratados, insígnia militar, etc.). E é cercado pelas palavras Annuit Coeptis, querendo dizer que: “Ele (o Olho da Providência) é favorável aos nossos empreendimentos”. Também aparece na parte detrás das notas de U$ 1 dólar. Se você, caro Leitor, tiver uma no bolso, dê uma olhadinha…
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*Assim conhecido e chamado, o Livro dos Mortos do Antigo Egito foi composto pelos antigos sacerdotes egípcios, como um “manual” de orientação espiritual para o morto, quando este estivesse no Além após a morte. Mas o nome original deste livro é outro, chama-se: “Saída para a Luz do Dia”. ** Tal simbolismo também migrou para as crenças hebraicas primordiais, onde a serpente ou cobra se mostrava como o mais sábio dos animais, a ponto do Deus hebraico lhe conceder a fala (Gn 3:2 e 3:4; Êx 7:9,10; Nm 21:8,9). Em tempos antigos, a serpente era também um símbolo de renovação, dado a sua periódica troca de pele. Em muitos povos antigos, a serpente era por isso cultuada como um símbolo de sabedoria e de renovação.
*** Gardiner e Osborn, 2008, pg. 110. Os ofitas-nachaítas (também naasenos) consideravam a serpente como “o Ser Supremo”. Os ofitas, de um modo geral, são seitas gnósticas que se desenvolveram por volta do ano 100 de nossa Era. Estas seitas atribuíam grande importância à serpente mencionada no livro da Gênesis, que fora a tentadora de Adão e Eva, considerando-a como portadora do conhecimento do Bem e do Mal, e portanto, passando a ser um símbolo da gnose, um símbolo da sabedoria.
REFERÊNCIAS: —ANÔNIMO. O Livro dos Mortos do Antigo Egito. Hemus Editora Ltda., impresso no Brasil. Prefácio de Luiz Carlos Teixeira de Freitas. Edição de 1982.
―GARDINER, Philip; OSBORN, Gary. O Graal da Serpente, 1ª edição. São Paulo, SP: Editora Pensamento-Cultrix Ltda., 2008.
―MACNULTY, W. Kirk. A MAÇONARIA, Símbolos, Segredos, Significado. São Paulo, SP: Livraria Martins Fontes Editora Ltda., 2007. Impresso em Cingapura.
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